terça-feira, 16 de junho de 2009

Contaminado pelo amplo entendimento de escritura proposto por Derrida e pelo compromisso ético-estético do fazer-dizer performativo de Setenta, exercito uma escritura videoalfabéticafotográfica para formular algumas sínteses provisórias a respeito do processo singular de apropiação das diferentes grafias urbanas. Neste texto, pretendo partilhar algumas questões problematizadas pelo processo investigativo em dança caligrafia=design performativo em colabração com a artista Paula Carneiro.

Proponho, nesta investigação, pensarmos não no conceito, mas na idéia do jogo linguístico de caligrafia enquanto traço que se configura em diálogo com o ambiente, no caso desta investigação, o ambiente urbano, e se singulariza pelo modo de se apropiar das diferentes grafias urbanas.

Diversas estratégias estão sendo experimentadas nesta pesquisa como: andar pela cidade atento à permeabilidade do ambiente, criar um inventário de imagens através de um registro alfabético ou fotográfico, utilizar o inventário alfabético para super estimular o corpo e colapsar padrões corporais através do jorro de metáforas e narrativas, criar objetos relacionais a partir de imagens sugeridas e objetos encontrados na rua, investigar uma escrita silábicapictóricaalfabética, parangolear a escrita. Porém, antes de detalhar melhor essas estratégias defino o que entendo por traço caligráfico e caligrafia nesta investigação. 

O traço caligráfico é entendido por mim enquanto movimento, ações no espaço (papel, palco, rua, tela de computador...) que configuram diferenças provisórias, uma diferença em andamento que se formula na tensão do contínuo que atravessa o legível, o ilegível, a tradição, a singularidade, a estabilidade, a instabilidade... Aqui o percurso do traço é mais importante do que as definições e o acabamento do discurso, o foco é o decurso do discurso, o inacabamento do discurso abre as perspectivas para que o traço continue formulando outras grafias ou escrituras.

Este traço não é metafísico, numa dimensão individual ele se configura pela contínua apropiação do indivíduo das diferentes grafias. E na dimensão do ambiente, diferentes traços se configuram numa relação de co-dependência e contaminação das diferentes grafias no espaço negociando a sua organização a todo momento:

 

Num certo sentido, o conceito de traço poderia ser considerado ainda mais essencial ao modelo de Derrida do que o conceito de “escritura”, na medida em que não pode haver escritura sem traço, sem inscrição violenta, sem resíduo. Mas, novamente, Derrida tem um entendimento dinâmico de traço, isto é, o traço é tanto movimento como substância, tanto protensão em direção a um futuro como retenção de um passado. Derrida insiste repetidas vezes que o traço não é nada, ele não é, propiamente falando, uma entidade ou substância. (JOHNSON,2001:39)

 

       Existem muitos modos de pensar a caligrafia, no entanto me interessa jogar com a idéia de caligrafia enquanto escrita singular e não enquanto arte da bela escrita. Podemos partilhar de um mesmo tipo de caligrafia culturalmente, mas imprimimos uma singularidade no modo de caligrafar nossas escrituras. Através de vivências das diferentes escrituras e inscrições urbanas, proponho transformar letreiros, manchas no muro, grafites, espaços arquitetônicos, sacos de lixo em caligrafias corporais provisórias da minha memória urbana, dinâmica temporal e de diferentes experiências de vida na cidade. 

Um comentário:

  1. Oi, Leo. Proposta bem interessante. Instigante. Bons pressupostos como o da caligrafia = design performativo e jogo linguístico. O nome veneno de rato é muito bom, lembra morte lenta, idéia de levante, pois remete à estratégias de resistência e coexistência, já que quase todos nós partimos do conhecido exercicio da bela escrita escolar. Ah, tente ler algo sobre grafologia p'ra entender e compreender as apropriações, como tbm alguma leitura sobre mestiçagem cultural...Por "fim", vc foi bem feliz na construção do último parágrafo, sintético sem excesso de objetividade. Vamos nos falando. Grande abraço.

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